sexta-feira, 20 de maio de 2022

 A REALIDADE DO VAR

Eu venho lutando para convencer meus parceiros de Facebook que o VAR significa transferir os erros do juiz pra dentro de uma cabine fechada onde o juiz fica invisível, cometendo seus erros sem observadores.
Desde o tempo em que eu dizia para o primeiro juiz dos juízes, "Mario Vianna com dois enes". que o árbitro foi um "soprador de apito", de volta de alguma filmagem no estados da federação.
Tenho repetido que o Flamengo vinha sendo ajudado porque todo árbitro sonha virar comentarista da Globo e a Globo significava Flamengo. Agora um articulista do Globo comprova tecnicamente que o VAR pode mudar um resultado e por ironia demonstra isso com um gol legal do Gabigol anulado pelo VAR. Basta ler o comentário no Globo deste sábado. Mas pra os preguiçosos reproduzo aqui, com méritos para a empresa Globo.
Gustavo Poli: Gabigato de Schrödinger
Quando o VAR escolhe um quadro, a nuvem de possibilidades colapsa, e Gabigol fica impedido
No início do Século XX, o físico alemão Werner Heisenberg teve uma percepção que revolucionou a física — e lhe valeu o Prêmio Nobel de 1932. Ele enunciou o que viria a ser chamado de “Princípio da incerteza”. Num resumo grosseiro: não é possível medir a posição e a velocidade de uma partícula ao mesmo tempo. Podemos saber onde ela está. Ou quão rápido se move. Nunca os dois juntos. O máximo que podemos chegar é a uma probabilidade. Este elétron tem determinada chance de estar aqui agora. Outra chance de estar ali. Onde ele está realmente?
Onde estava Gabigol quando a bola deixou o pé de Everton Ribeiro? A tecnologia, em tese, nos permitiria captar o exato instante em que bola e pé do passador se tocavam, certo? Errado. Mesmo com os 30 quadros por segundo de uma transmissão HD... por vezes essa imagem se perde. Foi o que aconteceu no último domingo na partida entre Botafogo e Flamengo.
O impedimento sempre foi a regra mais inaplicável do futebol. A lei exige que o olhar humano do bandeirinha fotografe a posição do jogador-alvo no instante do passe. Em outras palavras, o sujeito tem que ter um olho no gato e outro no peixe ao mesmo tempo — algo impossível. O VAR ilustrou essa limitação e nos apresentou os nano-impedimentos, em que milímetros numa imagem borrada definem partidas ou campeonatos. Todo juiz de VAR hoje é uma espécie de velocista com microscópio: o sujeito tem que decidir, com rapidez, as bordas de um atleta pixelado... marcar ombro, tronco, pé... e ai daquele que errar.
A graça do futebol está na imprevisibilidade. É o esporte de massa em que o fraco pode derrotar o forte. A arbitragem sempre foi um fator extra dessa equação. Mas a profusão de câmeras e novos ângulos começou a expor erros muito crassos. Depois de muito resistir, a International Board entubou o chip na bola e o VAR. Agora vivemos uma outra era: a dos micro-acertos, do detalhe ínfimo, do fiapo de cabelo decisivo.
O princípio da incerteza é uma das bases da Mecânica Quântica, a Física que explica o mundo micro. Conciliá-la com a Física Clássica (que explica o mundo macro) é um dos grandes desafios da ciência atual. A Fifa resolveu sua incerteza com uma decisão objetiva: se a câmera não captar o momento do toque, deve usar o fotograma seguinte. Foi isso que anulou o gol do Flamengo. Gabigol estava em posição legal e impedido ao mesmo tempo até o momento em que a realidade — em forma de VAR — fez sua escolha.
Em 1935, o físico austríaco Erwin Schrödinger concebeu um experimento mental que ficou famoso por ilustrar as possibilidades quânticas. Imagine um gato numa caixa com um frasco de veneno. Não sabemos, em determinado instante, qual a situação do felino: se o vidro se quebrou, se ele está vivo ou morto. Logo ele está num estado “vivomorto”. Se abrimos a caixa, porém, a observação define o estado do gato — ele passa a estar vivo OU morto.
Em suma, quando o VAR escolhe um quadro, a nuvem de possibilidades colapsa, e Gabigato de Schrödinger fica impedido. É quase uma ironia ver essa jogada-experimento no mundo da gravidade e das grandes esferas. A caixinha do futebol, já diziam os antigos, é repleta de surpresas.
Mais uma prova de que não falo besteira nem provocação ao Flamengo. Fui repórter esportivo por quase 20 anos e viajei com a seleção brasileira de 1958 e com Bangu e Fluminense ao exterior, entre dezenas de outros feitos. Minha idade permite-me uma acumulação de experiências, infelizmente. Não posso ser bobo com a lógica.
Tu e Mauricio Magalhães
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Tristeza
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