domingo, 25 de junho de 2023

 

DO MARACANÃ

Ao meu amigo Fábio, flamenguista de raiz mas com capacidade e autonomia para pensar. O Flamengo é um fenômeno que não tem comparação e nunca ou dificilmente se repetirá. Eu sou testemunha ocular da história. É verdade que os acasos sempre o ajudaram a crescer. Todos sabem que um pedaço do Fluminense, portanto da elite, se rebelou por razões de egoísmo e se separou do clube, nem sei se se demitiram ou apenas criaram um caminho próprio para dar vazão a suas vaidades. Eram também remadores, que na época era esporte de elite. Ou seja, o Flamengo de raiz é elite. Hoje ele domina a faixa da tecnocracia das grandes empresas e serviços públicos, de alto poder aquisitivo e mais, forte prestígio junto aos poderes da república, construído desde o final dos anos 70, no auge de poder da Rede, quando fazia e desfazia presidentes e ocupava com suas novelas todo o território nacional. Decidiram pegar o Flamengo, que potencialmente correspondia aos requisitos do projeto e fizeram um acordo, mais na prática que nas regras jurídicas. Interessava à Globo multiplicar sua audiência pra ganhar mais na publicidade. Com um time forte, com os grandes animadores (que eles faziam, como afirmava o representante da Time Life nas suas memórias) e a capacidade técnica de cobrir todo o território nacional eles surfaram na audiência e faziam a cabeça da maioria da população. Como os produtos de caráter nacional eram de menor valor, não os objetos de luxo, encaixaram a cabeça da população mais pobre com algum poder aquisitivo, sabonetes produtos de limpeza, supermercados populares etc. E programas como Casamento na TV e O Povo na TV (algo assim)

Foi difícil penetrar no miolo do clube (já ocupado por oportunistas etc) e penaram um tempo até acertar com executivos de grandes empresas púbicas. E dispararam no IBOPE com programas populares de baixo nível, depois de um começo de melhor qualidade. (a ser continuado)

 

DO MARACANÃ (Continuação de texto anterior) A aposta da Rede Globo estava feita em 1979 e a equipe do Flamengo foi discretamente reforçada, mas não podiam correr riscos. O pacote incluía assegurar todos os pontos frágeis, tribunais esportivos, árbitros, uma avaliação dos concorrentes... O maior risco era o Atlético Mineiro que tinha o melhor jogador em atividade no país, Reinaldo, embora já um pouco debilitado de tanto levar porrada de beques brucutus. Zico era a grande promessa que foi muito trabalhado internamente para romper sua condição física pouco atlética. Internamente o setor de marketing da Rede foi encarregado de fazer o marketing do Flamengo e os anunciantes ganhavam o compromisso de compartilhar. A Varig era um tipo de principal patrocinador. A Globo dava banho em tudo por onde andava. E foi organizar a casa flamenguista, contando com recursos e condições superiores. O chefe de Marketing da Globo foi prestar serviços no Flamengo, com sua equipe. Na campanha pelo Torneio da Toyota em Tókio, que seria a primeira experiência de decisão num só jogo, (antes se faziam dois jogos, um na América Latina e outro na Europa ampliada) o marketing já estava ativo. Não gozava de patrocínio da FIFA, era um torneio patrocinado e organizado particularmente por empresários. Um projeto, estilo global, foi apresentado à Varig, o Torneio de Tokio nas asas da Varig, Varig, Varig. Eu conheci por acaso o responsável da Varig no grupo e o entrevistei no aeroporto de Lima, no Peru.

O Atlético vinha de várias disputas com o Flamengo e era páreo duro, ganhava e perdia. Mas esse risco não podiam correr. O prejuízo seria tremendo, imaginem.

Se a gente pensar, o que o Flamengo chama de mundial era inferior ao torneio de Paris ganho pelo Vasco em 1977 em Paris. (a ser continuado)

 

DO MARACANÃ III (continuidade) O jogo com o Atlético era lá e cá. A experiência com o Brasileirão não dava garantia de resultados. Em consequência, a classificação para a Libertadores também não dava garantia, o Atlético era imprevisível, tinha o melhor jogador da época, o Reinaldo. E o Zico não estava ainda no auge. O terceiro jogo foi necessário e tiveram de fazer em campo neutro, em Goiás. O Projeto Globo x Flamengo x Varig ser decidido num só jogo onde tudo pode acontecer? Pois é. Aconteceu o que nunca mais aconteceu. O árbitro foi bem escolhido, José Roberto Wright tinha boa imagem. (É meu vizinho, boa praça, vamos juntos à praia, mas nunca provoquei o assunto, nem ele abriu o jogo). A partida ficou muito tensa e de muitas faltas duras mútuas (mas não era o Cobreloa que seria demonizado?). O árbitro se viu de repente envolvido num polvorinho. Nunca saberemos se havia algum acordo, mas era com o Flamengo, então não se sabe, claro. No lance de tirar de campo o primeiro que fizesse uma falta, naquela altura ninguém acreditava. Mas logo o Reinaldo, o craque do jogo, fez um falta lateral no Zico, que rolou como até hoje o Flamengo rola. O juiz não teve a sensatez de entender que estaria decidindo o jogo, não era falta para expulsão, mas ele, tenso (para lhe dar crédito) botou o Reinaldo para fora. Não houve mais jogo e o Flamengo foi classificado. Podia botar uma estátua para o Wright na porta da sede, mas pelo menos o convidaram para ser comentarista de árbitros das transmissões da Casa.

 

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